Quão simples?

Quando pequeno, tinha no tamanho – e não no valor – dos presentes o suprasumo da realização como criança. Lembro que ganhei um caminhão de madeira num desses natais em família; o caminhão em si era pequeno, mas grande era a caçamba que fazia volume no papel de presente.

Ali cabiam latinhas, carrinhos, soldadinhos verdes e todos os brindes de Kinder Ovo que eu tinha. E ali, naquele espaço de tempo, não poderia pedir mais nada – porque não imaginava algo que pudesse ser maior que aquela caçamba, por sua vez maior que eu mesmo.

Quão simples?

Até então, nunca mais havia refletido a respeito. Foi necessária mais de uma década até entender que a verdade aparente diz respeito verdadeiramente ao valor do presente, seja ele subjetivo, escondido, atrelado ao que foi escrito ou mesmo desconhecido.

Jamais o tamanho. Nunca o preço.

Ninguém quer o mundo, porque todo esse mundo só quer um agrado. Quem não o tem, sabe se tornar amargo. E daí é que não se pode esperar nada.

De fato.

Dificilmente se pode obter um abraço sincero de quem tem no orgulho o sentimento máximo de passar por cima dos outros quando não consegue o que quer; dificilmente se pode colocar culpa em quem surrupia a estupidez daqueles que abrem as portas de casa para depois serem criticados pelas costas.

Felizes os que fogem às regras da generalização. Quem, apesar de tudo, se emociona com a intenção e vê o que é de verdade e pode perdurar.

A esses, vale meu melhor de cada dia.

De uma mente sem lembranças.

Bem vindo à vida real.

Às regras onde não se busca – ou não adianta buscar – a fantasia, a rua movimentada, a festa ou o boteco; nem mesmo o respiro livre já estabelecido no ar. Onde todas aquelas reticências somadas, curiosamente, tornam a construir nossas irrealidades perdoáveis de seguir em frente.

Em tréguas e tempos. Em quaisquer expressões que possam ser faladas, visualizadas, pronunciadas, gritadas, sussurradas, explicadas e maltratadas em uma noite de luar no canto mais escuro da cidade sem vista pro mar.

O nada espera a tradução, eu espero a retratação. Peito aberto e olhos fechados a observar situações, a observar conversas e efemeridades de ano atrás, de transformações atuais.

Eram e são outros carnavais irrepetíveis, onde lembranças vêm como fonte de sorriso vitalício – nem sempre por terem sido positivas, mas por terem tornado, ao menos alguém, uma pessoa um pouco melhor.

E qualquer coisa, tu sabe, pode falar. E eu te amo, muito. Beijo.

Reset.

Ô vontade.

Não seria eu se não quisesse ou ao menos pensasse em uma maneira diferente de sumir ou dar adeus. De, mesmo voltando, ir.

Ao norte até que o cansaço vença, naquelas típicas e intrínsecas lutinhas entre o bom e o ainda melhor.

Não que a necessidade me obrigue a sair.

Não que a premissa inicial seja manter.

Não que a realidade me faça querer fugir.

Mas parar o relógio enquanto o de todo mundo segue andando me serviria. E a intenção não seria tirar proveito, acredite. Não seria nem envelhecer mais devagar; apenas a liberdade.

Porque não faço a mínima ideia do sensato sentido de liberdade, aquele mais verdadeiro, mais justo. Aquele da expressão que teima em não sair de cima da mesa de cabeceira, esperando ser lida, compreendida; decifrada tal qual um mistério destinado àquele detetive, o Poirot.

Ô pensamento que segue e que continua e que não sai da cabeça.

Ô dia que nunca chega.

Ô momento que será sempre esperado ou desesperado.

Ô vontade.

Talvez na última vez.

Naquele dia ela me parou e disse “tudo passa”. Complementou com um discurso que me fez relembrar coisas esquecidas – porque minha memória não anda boa e meu raciocínio sempre foi meio devagar-quase-parando.

Me fez ponderar sobre as realizações da gente e da nossa gente. Do nosso povo humano, redundâncias totalmente à parte. Sobre um mundaréu de distinções em gente tão única e plural, tão dinâmica e lenta.

Ela me falou sobre pessoas geniais e seus feitos, suas realizações, suas histórias, seus defeitos. Sobre seus legados. A respeito de suas eternidades garantidas e resguardadas em atos originados do nada – ou de algum lugar o qual ninguém jamais foi capaz de localizar, seja na Terra ou no vermelho do inferno.

Eternidade.

Mesmo que tudo um dia acabe.

Ainda assim, não passei a distinguir os porquês e as razões, afinal cabe a cada um saber o que é melhor pra si, mesmo que não se reflita sobre todo e qualquer caminho que uma vida pode tomar. Eu não seria alguém capaz de medir ou julgar porque falo mais do que vivo – ou falava, um, dois anos atrás.

De qualquer maneira, não meço a crítica nem a zombaria. Não devolvo. Não nutro ódio e nem me baseio nisso pra ver no que vai dar depois.

Sei somente que existe gente pequena. Pequena tal qual eu, tu, nós e vós.  Tal qual eles mesmos.

E se paro pra chamar alguém de menor, de pequeno, sem me igualar e me ver como tal, vou de encontro ao ponto o qual critico antes de viver. Ao invés, em vez, por vez, talvez por isso, prefiro admirar uma estrela à noite, com pensamentos positivos ou não.

Sei que, ao fazer isso, ao menos, ajo diferente das milhões de almas que não são capazes de vislumbrar o potencial das coisas simples e de nós mesmos. Que se resumem a assinarem embaixo o termo “sou uma pessoa pequena e pra sempre serei, porque isso que é legal” e não olharem para cima.

Porque, principalmente, em meio a isso tudo, passei a aprender que positividade verdadeira tem a ver com outras coisas, outras pessoas e outros prováveis futuros – ainda que o resultado seja sempre o mesmo quando o juiz apita o final da partida.

Take a look to the sky just before you die. It’s the last time you will.

“Há 5 anos eu me detestaria.”

Falta de reconhecimento é apelido para o menino que ficou perdido em 2008.

Talvez, e só talvez, se soubesse o que viria pela frente, teria desejado uma ou duas ou três pausas e o consequente congelamento de ideias. Teria clamado ao relojoeiro mais próximo por um ponteiro dos minutos travado e sem ação.

Com acesso ao futuro, tenho certeza que me odiaria por prestar atenção em músicas de 20 minutos, em seriados de 25, em documentários de duas horas.

Teria nojo de mim por passar a dar maior valor aos clássicos.

Teria medo de mim.

Me diria para não agir, sob qualquer circunstância, de maneira a reviver um ciclo terminado até então, enterrado em uma caixinha de tamanho significativo.

Teria total repulsa ao saber que, cinco anos depois, continuaria tentando agradar de novo e sempre – mesmo o “sempre” limitando-se ao dia de hoje. Ganiria à ventania quão alto precisasse, me xingando através do orgulho frio e persistente que ainda nutria na alma.

Se surpreenderia ao saber que, dentro de alguns determinados anos, a parte ruim de um dia poderia ser amenizada por um sorriso, cabelos presos, boas conversas humildes e pequenos olhos claros.

Há cinco anos, aquele menino odiaria a busca incessante de respostas à rotina em livros que contam no íntimo a potencial história da tragédia humana, do desastre estampado em palavras tal qual se pode ser.

Há tanto tempo, não imaginaria se ver desanimado ou cabisbaixo outra vez, de uma maneira complicada e um pouco inevitável, repetida e quase idêntica àquela tão recente.

Cinco anos atrás, ele só conseguiria pensar “não tenho culpa disso tudo aí, ainda assim te peço desculpa”. Sei disso, rapaz. A culpa não é tua. A culpa não é de ninguém.

Não clame sua culpa.

Digo querendo acreditar que são verdades. Digo acreditando que são realidades – de amanhã ou depois.

Digo matutando, aqui-comigo-mesmo, que temos responsabilidade pelo que somos e escolhemos ser, mas jamais pelas curvas-depois-das-curvas, pelo que vem ali frente – muito menos pela influência de dias passados no retrovisor embaçado.

Ô menino. É possível que quando me dirigir a ti novamente, 10 anos à frente do espaço de tempo onde tu decidiu acampar e ficar eternamente correndo atrás de objetivos, teu ódio aumente.

Ainda assim, te peço uma única coisa.

Me desculpa?

De verdade, ácido.

– Escuta o que te digo, menino. A verdade a qualquer custo não nos tem preço. Deixa de joelhos. Nos apaixona. Faz brilhar o olho enquanto a vemos em pleno movimento, em constante produção; em sincera abdicação de absurdos que inventam querendo mascarar.

Começar a entender as viagens, os desvios e os retornos da sinceridade, de acordo com o contexto, é meio difícil. Meio irreal, cara. Dificuldade das grandes. Tipo aquelas inspiradas em monstros que aparecem só na infância, sabe? Que não te deixam botar o braço pra baixo, rente à cama, dando a sensação que alguém vai puxar. E que quando puxar, tudo vai acabar.

Inspiradas na irrealidade dos pesadelos, dos túneis submersos e labirínticos sem fim, sem solução. Sem o ponto no final da frase

A verdade é que a maioria experimenta atalhos o tempo inteiro. Traiçoeiros, mas atalhos. A contradição do valor ao tempo acima de tudo e todos. A falta do balanço antes de cair a areia de um triângulo ao outro.

Fugir do padrão é raro. Ninguém o muda nem muda a si. Só carrega uma acidez alheia durante muito tempo, que desmancha e no fim desmente tudo que foi inventado e dito.

A única mudança verdadeira é o repentino contraste. A ácida sinceridade própria, desconhecida, evitada, porque no recomeço é difícil gerar passado; a realidade e a verdade viram exposição.

E se tornam a chance, a oportunidade.

Pegar ou deixar escapar?

– A verdade, a real verdade, é que sentiremos tua falta. Tua presença ausente e tuas contradições e explicações. E do teu lugar nisso tudo, em tudo isso.

– Ainda assim preciso ir.

– Tudo bem, nós de algum estranho jeito entendemos.

– Até mais.

A lua lá.

Te vi de longe e não acreditei. Mesmo, não acreditei. Ali, logo ali, mas do outro lado da rua, em uma direção paralela que jamais me encontraria, te vi. Vi a dona de um sorriso que felizmente é capaz de mudar nortes, mudar acasos, atravessar ruas e só então me encontrar com a guarda entregue.

Capaz de promover esse milagre de encontrar em uma imensidão de pessoas, de ruas e cidades, de apresentações em todos os cantos.

Encontro raro, curto. Especial e único. Simbólico e esperado. Anual mas contínuo. Intenso mas tímido. Como se deve ser, tal qual poderia ser escrito na etiqueta branca de uma camiseta ou na contra-capa de um manual em japonês.

Virou passado mas garantiu futuro.

E se olho a lua hoje em dia, penso “será que ela também olha?”. A lua lá, eu aqui e tu aí.

Talvez a olhemos ao mesmo tempo, talvez a admiremos com a mesma intensidade e o mesmo sorriso. Talvez tenhamos nela o depósito de um logo mais, a esperança de um daqui a pouco, a realização de um amanhã que vira hoje outra vez.

Mas, talvez, quem sabe, sei lá.

Só sei que gostaria de te ver outro dia, outros dias.

Ali ou lá.

Mesmo que mude completamente.

Entre extremos e hipocrisias, meus e minhas. Só meus e só exclusivamente minhas. Exagerados mas menos que os tais observados do lado de fora da porta imaginária criada por quem precisa criá-la para se sentir melhor ou mais falsamente feliz.

Na sinceridade, não encante-se, não importe-se, sua opinião mudará. Pode ter certeza.

Mudarei e você repunará. Desgostará. Enjoará. Irá.

Embora com raivas, mágoas, com ruins internos evidentes às indiretamente arremessadas chamadas erroneamente verdades. Processo de looping semi-eterno, sem fim. Ou com algum fim, talvez, escrito em forma de finalmente.

100.

Lugar algum senão todos os lugares.

Não havia lugar algum para ir senão todo os lugares.

Lendo, e só lendo, pude aproximar da racionalidade algumas visões teimosas, insistentes em não deixarem minha mente por muito tempo – as quais nunca fiz questão que fossem apagadas e que permanecem até hoje.

Por que eliminar certos sonhos? Por que excluí-los das confortáveis posições que ocupam, apesar de limitações totalmente ordinárias ao presente e ao momento? Por que desistir previamente de algo sem ao menos tentar e insistir e tentar de novo e insistir mais?

Não faz sentido.

Nunca fez e é provável que nunca faça.

A vida é uma ironia depois da outra.

Ao levar o lixo à seu destino, ando lado a lado com uma família desconhecida.

Eu sonho. Aquele pai guia seus filhos. Seus filhos pedem. Desde o carrinho à roupa, desde o colo ao carinho. E me parece claro que do carrinho ao carinho existe uma enorme disparidade, um mundo inteiro contido no espaço de uma letra. Uma prioridade.

Aliás, um universo de prioridades no qual os sensatos juntam-se aos jovens e os extravagantes se misturam aos entendiados. Quem é extraordinário tá perto de quem nunca o vai ser. Ninguém escapa. Nesse universo os bem humorados convivem com os sãos e às vezes os loucos.

Porque as prioridades não fogem à maioria de nós.

Uns são filhos da puta, outros não, e isso é tudo.

E o período que cada um permanece ativo é protagonizado cronologicamente por um eu individual com aspirações e sonhos, com tudo manifestado numa simples ida à lixeira no centro da cidade de noite chuvosa.

Essa garoa ajuda, inspira. Faz querer mais e empurra. Essa garoa traz de volta para casa, de volta ao cotidiano de botar coisas em ordem, aqui, ali, lá, e alinhar ironias como em um poleiro sequencial de passarinhos ou gaviões.

Veja só cara, é melhor não se incomodar.

Concordo, Kerouac.

Obrigado mais uma vez.

Ou aquilo também.

Escreve, junta, cola e une mas erra quando faz a pergunta. A pergunta, velho, que no final das contas é uma coisa responsável por te levar meio que ao canto mais extremo daquele bar isolado, no bairro tenso de uma cidadezinha qualquer do interior do Acre, no qual tu acaba entrando porque não sabe onde tá te metendo ou metendo tua vida.

No momento que a pergunta é deixada de lado, tudo se torna passado. Passado a limpo, mesmo presente numa lista cronológica e ingrata, somada e dividida em diversas outras e outros sensatos chutes de sorte ou azar, em experiência ou negação.

Guarda esse rascunho porque é certo a possibilidade dele se perder, de nós nos perdermos sabe-se lá onde ou com quem ou por quem. Afinal da futilidade se extrai um pobre valor agregado à vida mas desnecessário aos outros – quando em relação a ti, claro.

Sensatez faz falta quando o buraco é mais embaixo e tudo é quase nada ou o mínimo é tudo e mais um pouco. Acontecimentos, necessidade de defesa, batida inflexível de um coração que só quer seguir pulsando no ritmo incerto da correria diária de um lunático que deseja viver 109 anos numa felicidade ininterrupta e compartilhada pela família e por amigos próximos da cidade mas também do mundo apesar de mal conseguir respirar nesse tempo.

Ufa.

Acompanha que tu pode se tu quer, mas nada diferente disso! Na exclamação, na única, fica explícito que o quanto tu quer talvez emane de ti e reflita em quem não tem nada a ver, e isso é uma coisa necessariamente boa se a ação for acompanhada de positividade, alegria, norte bem definido, muita música boa e um cachorro parceiro do lado.

E se valeu a pena, valeu todos, cada e um por um dos segundos.

Se conseguir aquilo que você quer e conseguir manter a nobreza de ser quem tu é, tenha certeza que vai nascer uma planta. Que a flor vai ser de esperança, de amor pro que der e vier.